Metade dos stents (implantes para desobstruir artérias) colocados em procedimentos não urgentes tem benefício incerto ou inadequado, revela estudo feito nos EUA.
A pesquisa, publicada no periódico "Jama", avaliou 500.154 procedimentos para a desobstrução das artérias realizados em 1.901 hospitais americanos em 2009 e 2010.
A conclusão foi que, quando se trata de uma emergência (um infarto, por exemplo), a indicação dos stents está correta em 98% dos casos.
Quando o caso não é urgente, porém, apenas 50,4% das indicações estavam corretas. Na outra metade, 38% tiveram benefício incerto e 11,6% foram inadequadas.
Nos EUA, os stents farmacológicos, que liberam substâncias facilitadoras da desobstrução, são usados em 75% dos casos. No Brasil, estima-se um número bem menor (60 mil, o equivalente a 30% do total) porque eles só estão disponíveis na rede privada.
Ainda assim, a taxa de uso de stents com remédios no país dobrou nos últimos cinco anos, segundo dados da Central Nacional de Intervenções Cardiovasculares.
POLÊMICA
Uma das vantagens do stent é o fato de ele desobstruir a artéria imediatamente e de forma bem menos agressiva que a cirurgia tradicional. Mas o procedimento é indicado apenas a pacientes com perfis específicos -com uma isquemia (deficiência na irrigação sanguínea) de grande porte, por exemplo.
O cardiologista Paul Chan, um dos autores da pesquisa, defende a necessidade de melhorar o treinamento dos médicos para fazer as indicações do tratamento. Mas outros estudos mostram que, por trás das indicações desnecessárias, há um jogo de interesses entre a indústria desses dispositivos e os cardiologistas.
"Há um evidente exagero nas indicações lá [EUA] e aqui [Brasil]. Stent farmacológico dá muito dinheiro e tem muito médico fazendo a cabeça dos pacientes [para colocá-lo]", afirma Bráulio Luna Filho, do Cremesp (conselho regional de medicina paulista). "Os stents não aumentam a sobrevida e não reduzem a chance de infartos", diz ele.
O cirurgião cardiovascular Mário Issa, do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, diz que costuma receber pacientes que já tiveram indicação de stent por um outro profissional. "E na maioria das vezes não há a menor necessidade. É um abuso", afirma.
Segundo o cardiologista Maurício Wajngarten, do Hospital Albert Einstein, hoje há uma grande discussão nos EUA para rever as indicações de stents. "Vivemos a era do fazer. Quem não faz, sai perdendo. O paciente fica frustrado e procura outro médico, que vai fazer", diz.
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